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De onde vem a sua força?
Por Lara Santos
Meu nome é Lara Santos, tenho 20 anos, e a história que vou contar não tem relação com meritocracia, nem brilhantismo escolar. A minha Força tem laços profundos com oportunidades, informação, apoio familiar e de amigos que torcem e caminham comigo.
Hoje, sou caloura do curso de Direito da Universidade de São Paulo (USP), membro do Global Girls’ Panelists na Girls’ Bill of Rights e Young Leader na Women Deliver. Atuo em organizações que trabalham com a temática de gênero, inclusão e diversidade. Sou feminista e também cristã.
Início da trajetória como Menina Inspiradora
Gosto de falar que isso é a experiência de uma menina que cresceu no interior do Pará e se mudou para capital com intuito de ter uma educação de maior qualidade. Sempre fui aluna de escola pública, baixa renda e que morou na periferia e disso tenho muito orgulho. As oportunidades que tive na vida sempre foram regadas de muito esforço pessoal e familiar.
Pra começar, meu roteiro acadêmico, antes de chegar no Direito, passa pela Química. Só pra lembrar que a nossa trajetória tem dessas, às vezes, algo que parece perfeito pra você naquele momento pode não ser o seu real destino. No ensino médio, fiz técnico em Química pelo IFPA: minha turma era muito engajada em atividades extracurriculares, então me inseri em várias atividades de exatas, desde maratona de química até olimpíadas científicas pela influência maravilhosa deles. Entretanto, não me sentia confortável nessas disputas, fazer provas nunca foi meu forte, e eu fazia comparações descabidas com o desempenho dos meus amigos. Mas o IF me presenteou com uma rede de apoio que acreditava muito no meu potencial, me apresentando oportunidades como o Parlamento Jovem Brasileiro (PJB). Um programa desafiador que, de início, achei que nunca ia passar: na minha cabeça, sempre teriam pessoas melhores do que eu. Mas, mesmo assim, fui atrás de auxílios, como mentoria — queria um projeto de lei que fizesse sentido para minha realidade. Refleti sobre uma das atividades que eu mais gostava na minha escola: um grupo de estudos na área de filosofia que proporcionava Iniciação Científica ainda no ensino médio.
Levando em consideração o que já tinha vivido, o tema do meu projeto não poderia ser outro: educação. Propus que houvesse um maior incentivo nas escolas públicas para que garantissem aos seus alunos a chance de conhecerem a pesquisa científica antes de entrar na universidade.
O resultado que deu início a inquietação
Eu fui uma das três pessoas escolhidas do Pará, entre centenas de candidatos. Minha trajetória como menina inspiradora não sei bem onde começa, mas sei que tem laços profundos com 2017, ao ser selecionada para participar do Parlamento Jovem Brasileiro.
Até esse momento, política ou área jurídica estavam bem longe dos meus interesses. Eu queria mudar o mundo por meio da pesquisa científica e não por meio das leis. Naquela semana na Câmara, eu pude experimentar a sensação de ser uma referência para as pessoas e uma boa mediadora de conflitos. Saí do casulo participando do PJB, deixando meus medos e sentimentos de insuficiência bem escondidos. Aproveitei o máximo da experiência: eu pude me encontrar como uma jovem líder.
A importância do acesso às oportunidades
Eu sou muito privilegiada em ter tido oportunidades que me confrontaram sobre meu lugar no mundo e sobre como poderia participar da mudança atuando em primeira pessoa. E disso, veio uma aproximação com o movimento feminista. Ter uma consciência política e social sobre como é ser mulher no mundo — ao tentar romper com os estereótipos — nos faz lembrar da violência urbana e de gênero.
Voltando para minha vida acadêmica, houve algumas turbulências: no período do vestibular eu fiquei indecisa entre Direito e Química por um tempo. Acabei escolhendo a Química na UFSCar, levando em consideração que eu já tinha um currículo bem desenvolvido na área e que lá eu também poderia atuar em pautas de gênero.
Logo que comecei a universidade me inseri no coletivo feminino “QuiMinas“, que buscava falar/atuar sobre as violências de gênero dentro do ambiente acadêmico e nas festas universitárias, acolhendo as vítimas de violência e tomando medidas de prevenção contra essas situações. Também participei de um curso de educação popular chamado Promotoras Legais Populares de São Carlos: foi uma das experiências mais emancipadoras e sensíveis que participei. Nossas aulas tratavam sobre violência de gênero, direitos sexuais e reprodutivos, prazer feminino, direito da família, feminismo, Lei Maria da Penha e como mobilizar a rede de proteção das cidades para prevenir e cuidar das vítimas de violência doméstica. Minha turma era formada por mulheres de todas as idades, experiências de vida tão fortes e inspiradoras. Todos os encontros eu saía com vontade de mudar de curso e ir pro Direito.
Ter feito um voluntariado na Delegacia da Mulher de São Carlos com o intuito de me aproximar da vivência de acolhimento de mulheres após sofrerem violência também me moldou. Não foi uma tarefa fácil, mas me motivou a persistir no sonho de construir espaços que respeitassem a história que as pessoas viveram, sem julgamentos machistas e misóginos.
Até que trancar a faculdade e tentar o vestibular mais uma vez se tornou inevitável. Dessa vez, para o Direito.
Atuação como defensora dos direitos das mulheres
No ano passado, eu desfrutei de uma vivência bem especial, como eu falei no início, sou jovem líder da classe de 2018 da Women Deliver, uma organização internacional que capacita meninas e mulheres que atuam para diminuir a desigualdade de gênero no mundo. Uma das oportunidades do programa é a participação na Conferência da Women Deliver, no Canadá, que discute com líderes mundiais como solucionar os problemas globais que afetam gerações de mulheres pelo mundo. Sem dúvidas, experienciei palestras de altíssimo nível, conheci organizações com impactos profundos na vida de crianças, famílias e cidades que tratavam desde do direito ao leite materno até o direito ao aborto. O mais impactante e transformador foi compartilhar os corredores do evento com ativistas da América Latina que possuem histórias como as nossas e constroem narrativas e projetos brilhantes. Nossas lutas são parecidas e o brilho nos olhos e a garra para fazer o mundo melhor também.
Mas uma coisa não foi possível de não se notar: colocar pessoas parecidas conosco nesses eventos mundiais é um grande desafio. Ainda faltam mulheres negras, LGBTQI+, indígenas e deficientes nesses lugares. Ocupar esses eventos ainda não significa uma vitória de todos nós, só de uma parcela das que foram privilegiadas com a possibilidade de preencherem os requisitos.
O inevitável pensamento de ‘não se encaixar’
Esse sentimento de subalternidade diante da nossa trajetória é bem comum quando começamos a participar de eventos nacionais e internacionais. Apesar de sermos referência de onde a gente vem, quando ocupamos esses espaços as cobranças pessoais e o sentimento de não pertencimento ou de insuficiência são bem comuns. Contudo, sempre teimo em pensar como a minha geração é privilegiada em voar tão alto questionando e quebrando esses estereótipos que são comuns na vivência como menina.
São frequentes os questionamentos a nossa inteligência, às nossas capacidades aos nossos sonhos. É essencial apoiar-se nos amigos, na família e aprender a ter você mesma como incentivadora dos seus sonhos. Tem vezes que a caminhada é sozinha, mas ter um pouco de fé em você e no seu propósito vai com toda certeza te levar pra perto de gente que vai sonhar e construir junto de você.
Minha voz tem força
Quando a gente é menina, uma coisa comum socialmente é nos fazer calar, nos relegar os cantos para que possamos chorar quando passamos por algum abuso ou violação. E mais comum ainda é tratar isso como exagero da nossa parte, negarem nossas denúncias e desacreditarem das nossas histórias. Ou seja, toda hora nos lembram que é melhor permanecer calada. Mas a verdade é que às vezes eu grito, denuncio, faço alarde. Só que dói na alma perceber que vão ter outras que não vão ter a minha chance ou a sorte de permanecerem vivas. Isso aconteceu comigo, com vizinhas, amigas e irmãs. Todas silenciadas, mas eu sonho em poder ajudar e dar voz para muitas dessas mulheres. Daí, o Direito surgiu como missão de vida.
Depois dessas chances que a vida me deu, o medo e a síndrome do impostor ainda persistem em tomar lugar em situações da minha vida. Contudo, me sinto forte ao pensar que eu sou a geração da minha família que mais pôde usufruir da liberdade de ser mulher, de ter escolhas e abertura de escrever minha história com meus próprios punhos e fazer minha voz ser ouvida.
A boa notícia é que deu tudo certo com o vestibular, agora estudo Direito na melhor universidade do país, isso era um grande sonho e estou bem empolgada com tudo que a universidade oferece. Continuarei construindo um legado de acolhimento, escuta ativa e empoderamento de meninas e mulheres ampliando suas vozes da melhor maneira que puder.
Ter encontrado minha Força pode ajudar outras a fazerem o mesmo
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